deixo
a meus filhos versos cultos
e
também prosas às centenas
(os
meus dois filhos são adultos
e
as minhas filhas são pequenas)
e
muito amor: não deixo apenas,
tudo
somado, alguns direitos,
e
fui bom pai, nunca fiz cenas
e
fi-los sãos e escorreitos.
e
à minha neta Francisquinha,
senhora
que é do seu nariz,
deixo
a ternura que esta linha
desajeitadamente
diz
e
seja a flor desta raiz
já
desgrenhada que deu frutos
e
tenha sorte num país
em
que o avô lidou com brutos.
aos
meus irmãos, aos meus cunhados,
à
primalhada, um grande abraço,
lembrando
bons e maus bocados
que
reforçaram sempre o laço
que
nos unia a cada passo,
quer
no lazer, quer no trabalho,
e
quando eu for lívido e baço
sintam
que assim eu inda valho.
não
creio em deus, não me atingiram
seus
metafísicos engodos.
no
homem que sou evoluíram
peixes,
macacos, algas, lodos,
celtas,
judeus, romanos, godos,
mas
recebi, por formação,
os
sacramentos quase todos
e
só me falta a extrema-unção.
"
- terceira idade", digo e brinco,
sem
ter poção nem amuleto
que
me devolva aos trinta e cinco
e
reestofe o esqueleto.
outros
fariam um soneto
de
hora final quando a mão treme,
eu
escrevi este folheto
e
assinei-o vgm.
Vasco Graça Moura
Sem comentários:
Enviar um comentário