Neste
texto é abordado o tema da experiência amorosa e o assunto compreende os efeitos
contraditórios que a observação da mulher que ama causa no sujeito poético e o
sofrimento amoroso provocado por esse momento.
O
poema é um soneto, logo é constituído por duas quadras e dois tercetos, num
total de 14 versos decassilábicos: Tan/to/de/meu/es/ta/do/me a/cho in/cer/to.
A rima é interpolada e emparelhada, com o seguinte esquema rimático:
ABBA/ABBA/CDE/CDE. Em todo o texto, a rima é rica, pois as palavras rimantes
não pertencem à mesma classe gramatical (“incerto” – adjetivo/ “aperto” – forma
verbal), com a exceção dos grupos de versos 9 e 12 e 11 e 14, em que a rima é
pobre (“voando” / “ando” – formas verbais).
Esta
composição pode dividir-se em duas partes. Na primeira, que corresponde às três
primeiras estrofes, é descrito o estado de espírito do sujeito poético,
caracterizado por sentimentos contraditórios e pelo “desconcerto” (v. 5), pela
tristeza, pelo sofrimento. Na última estrofe, que corresponde à segunda parte,
descobrimos uma possível causa desse estado de espírito: a observação da mulher
amada.
Os
sentimentos do sujeito poético são tão intensos que se tornam contraditórios
(“que em vivo ardor tremendo estou de frio” – v. 2). Ele está em desacordo
consigo mesmo e em sofrimento. O “eu” lírico suspeita que o amor, isto é, a observação
da sua amada, seja a causa desse conflito interno. Ao longo do soneto, para
realçar a inquietação atual e contínua do sujeito poético, são utilizadas
antíteses (“ardor” / “frio” – v. 2; “choro” / “rio” – v. 3; “todo abarco” / “nada
aperto” – v. 4; “fogo” / “rio” – v. 6). Também com a finalidade de demonstrar a
sucessão e a intensidade deles, o poeta recorre a anáforas (“agora espero,
agora desconfio/ agora desvario, agora acerto” – vv. 7-8), que mostram igualmente
o estado permanente de ansiedade e de sofrimento em que o sujeito poético vive.
Como já foi visto noutros textos de Camões, o amor é aproximado a realidades
intensas, como os elementos da natureza, para realçar o fervor deste
sentimento, como podemos observar no verso 6 (“da alma um fogo me sai, da vista
rio”). Nesse verso, assim como no 9, observamos hipérboles, usadas para
amplificar o sofrimento do sujeito lírico e para destacar o delírio amoroso do
“eu” poético (“estando em terra, chego ao Céu voando”). O desejo de ver e de
estar com a mulher que ama é tão forte e o estado de perturbação dele é tão
veemente que tem uma perceção contraditória do tempo, criando assim um paradoxo
(“nu’hora acho mil anos” – v. 10). A utilização da apóstrofe (“minha senhora” –
v. 14) remete para a noção de mulher inatingível, a quem o sujeito poético
presta vassalagem. Todos estes sentimentos conflituantes são provocados pelo
amor, o que o transforma num sentimento contraditório.
Na escrita deste
poema, Camões teve influências italianas, de Petrarca e da lírica trovadoresca.
Vemos a influência da poesia trovadoresca quando a mulher amada é referida como
“minha Senhora” (v. 14). Em grande parte das cantigas de amor
galego-portuguesas, assim como no texto, não existe interação entre os dois,
somente contemplação da senhora por parte do sujeito poético (trovador), que lhe
presta vassalagem sem esperar nada em troca. Também é influência desta forma de
literatura o facto de a contemplação da mulher amada ser uma etapa do processo
amoroso. Já a influência de Petrarca é mais extensa. Petrarca foi um poeta
renascentista italiano em quem Camões se inspirou para descrever a figura
feminina dos seus poemas (cujo retrato idealizado vem já das cantigas de amor).
Nos seus poemas, o “eu” lírico descreve o desconcerto e o sofrimento provocados
pela observação da amada, bem como os efeitos contraditórios do amor, tal como
o poeta português faz neste poema. As influências italianas resumem-se ao uso
do soneto e do verso decassilábico.
Podemos
então concluir que o amor, nomeadamente a visão da mulher que ama, perturba o
sujeito poético ao ponto de ficar num estado permanente de ansiedade e de sofrimento
devido à contradição dos seus sentimentos. Camões relata este acontecimento,
embelezando-o e enriquecendo-o de uma maneira única, como nenhum outro poeta
português alguma vez conseguiu, mostrando-nos mais uma vez o seu valor e a sua
superioridade em relação a todos os outros grandes poetas.
Joana Pinto Coelho
N.º 4
10.º AB
I AM
ResponderEliminarthank u so much bae!
ResponderEliminar